sábado, novembro 21, 2009

EVANGELHO SEGUNDO AS MÃES

Foto- Silvia Câmara
god god god

um dia disse à minha mãe
que deus em inglês
parecia com o cão:

dog dog dog


ela me ameaçou com apocalipses
e não se falou mais nisso.

(Um poema de Samuca Santos )

segunda-feira, outubro 19, 2009

A aguada constelação em torno de um poema

Foto: Sílvia Câmara


Copiei parte do título em algum lugar.
Apenas por achá-lo lindo;
Como pode uma constelação ser aguada?

Pode, claro!
De quem são os olhos que a veem?

Ouvi um poema e fui olhar o céu.
Os dois — poema e firmamento—
Absolutamente lindos.

Copioso olhar lançou-se então.
E foi assim que se estabeleceram a relação e o nome.

Sílvia Câmara

domingo, setembro 20, 2009

Da cor da folha caída


Foi nesse instante,
Quando a folha despediu-se do galho
Último olhar de um a outro
E um adeus da cor do outono.
Descobri naquele ato
A mesma cor dos olhos amados.

Silvia Câmara

sábado, julho 11, 2009

Sagração e perdição

Foto- Silvia Câmara

Lá o céu era muito azul
E eu pensava ser moura.
O vento soprava e eu ouvia

Passou...passou...

Meu príncipe não era mais andante
Pois, se sagrou-se cavaleiro,
Tinha agora que correr mundo.

Quem dera aquele alazão
Tivesse as asas de Pégaso
E pousasse na minha janela.

Sílvia Câmara

sábado, junho 27, 2009

Da cor da terra

Foto- Silvia Câmara


A menina abriu o ferrolho
Escancarou a porta e
ganhou o mundo.
E girando, girando
O tempo passou.
A menina cresceu
Mas não se esqueceu da terra
Aquela que deu cor aos seus pés.
Uma cor tão cor
Que vazou pela menina dos olhos
E fez-se.

Silvia Câmara
( por conta de umas trocas de e-mail com amigas PI)

sábado, maio 30, 2009

Coração viajante

Foto: Silvia Câmara


Viajei mundo afora
Mas em todos os lugares
Só via meu coração.

É que o coração também voa
E carrega nossos afetos
Por onde passa e sente.

Será que o coração é a gente
Ou a gente é que é coração?

Sílvia Câmara

sexta-feira, março 27, 2009

Escrito pelo vento

Foto- Silvia Câmara
Aquilo tudo foi escrito com o aval do vento. Depois de contada a história, a assinatura firmada foi a dele. Alguns disseram ouvir um crocitar. Da parte, dela apenas escutou um cicio. Cada qual ouve o que mais lhe aprouver. Melhor para ela então.


Violeta marcou encontro na curva do eucalipto grande. Eles se haviam encontrado, corrigindo: eles se haviam olhado duas vezes antes — quando o condutor da carroça parou para perguntar pelo pastor e no dia em que o rio encheu, inundando a vizinhança de Violeta. Como dizia a avó: é o apocalipse. Esse barulho imenso só pode ser o juízo final. Umas fagulhas sombrias caindo do céu e uma tromba d’água desembestada vindo serra abaixo.


A prima que criava borboletas conseguiu partir para as terras mais altas. Lá, dizia ela, tem uma árvore onde posso colocar minhas crias para dormir e, se for preciso, elas entram na casca, sugam o sumo e ficam adormecidas como ursos hibernando. Quando terminar o dilúvio elas saem e voltam a voar como no primeiro dia de primavera. Daí então eu posso trazê-las outra vez para casa. O que acontece quando preciso usar tal expediente é que elas não querem dormir na primeira noite. Ficam borboleteando em volta da minha cabeça como se pedissem mais sumo. Faço de contas que não estou escutando, até que lá pelas três horas da manhã elas se aquietam, mas não por muito tempo. Às seis elas já estão prontas para começar o bailado matinal.


A tia que tratava dos umbigos dos recém-nascidos avisou que não iria sair da casa. Precisava ficar alguém para tomar conta da horta de umbigos. E a horta já estava tão grande que mais parecia um pomar. É que a cada umbigo que ela enterrava, plantava uma muda diferente. Até que a diversidade de plantas da cidade acabou, então a tia começou a repetir. Percebeu-se que, dependendo de como era a saúde da criança, a planta nascia mais ou menos viçosa. Bem, isso era o que dizia ela. Havia uma suspeita de que ela trocava as mudas de lugar, pela madrugada. A prima borboleteira foi quem confidenciou que uma noite em que as borboletas faziam serão, ela ouviu barulho de terra cavada e viu a tia colocando uma muda no lugar em que havia outra antes. Só não sabemos é se o fato se confirmou.


Quando o relógio da igreja bateu a primeira hora da tarde, Violeta desvestiu o avental e avisou que iria observar o ninho de uns periquitos roxos que arribaram não se sabe de onde e fizeram morada na cidade. Só que ninguém sabia onde ficava. Somente Violeta dizia desses periquitos. A família acostumada a ver tantas esquisitices, achou a coisa mais natural.


Só que Violeta correu para a curva do eucalipto grande. Não se sabe o que deu nela para marcar encontro com aquele moço estranho. Não se sabe nem se ele iria comparecer. Mas na cabeça dela estava tudo acertado: dois dedos de prosa e um anel de noivado, antes que o mundo se derretesse em água. Ela chegou mais cedo e ficou olhando com aquele olhar de prata liquida, nenhuma ansiedade, apenas certeza.


Primeiro veio uma brisinha ligeira, a água já se despejando. O barulho que ela ouviu nem chegou a ser barulho, era apenas um farfalhar. Um soprar de nuvens, bafejo de anjo. Bom ou mal? O futuro foi quem mostrou. A moça sentou-se sob o eucalipto, arrancando as casquinhas do tronco secular. À proporção que ela mastigava, uma cor amarelecida toldava-lhe o semblante, mas ela, desapercebida, continuava a labuta e a espera. Estou pronta! Se pudesse ter escolhido, talvez tivesse nascido água. Porque para a água é mais fácil dizer eu te amo, ela passa por todos os lugares, penetra nos mais íntimos segredos. Descobre todos os mundos, a despeito de qual seja o gênero.


E também se fosse água, sua dedicação talvez residisse em esmiuçar os segredos do silêncio, da morte e da vida. Quiçá desconstruindo as fronteiras que teimam em resistir aos sentimentos. Havia entrado num espaço sem retorno. Igual a acreditar em Deus. Sim, porquanto a nossa impossibilidade de definir quem ou que é Deus, repercute muitas vezes nas nossas crenças. Se ele me escuta e nascem flores, vejo-as junto de mim, ao alcance do coração. Violeta continuava a espera e a água já começava a delinear o caminho do céu a terra.


Foi tudo muito rápido. Passaram os periquitos, as borboletas, os umbigos germinando, as cascas descomidas do eucalipto e aquele olhar: intenso, líquido, quase escuro de tão profundo. Nem deu para ouvir a chegada. Também não se sabe se ela dormia ou sonhava de olhos de abertos. O único que sabemos foi isso que o vento contou.


Sílvia Câmara

terça-feira, março 24, 2009

Dicotomia

Foto: Silvia Câmara

A ambivalência do querer
É não poder deixar o dentro
nem conseguir esquecer o fora.
Desejo conferir sentido ao passado
Mas um atemporal tempo não permite.
Busco a inteireza
Para além de tudo que me fragmenta.
Nesse compasso estranho
Emerge uma imagem
- Diretamente da alma -
Da Alma?
O saber-me no mundo:
Presentificação de mim
Ou espectro?

Silvia Câmara

quarta-feira, fevereiro 11, 2009

Reflexão

Foto - Silvia Câmara

Só porque eu pedi a Deus
Um par de asas,
Ele me fez refletir
Para quê?
Se tens toda a liberdade do mundo
Bem aí:
Dentro da tua cabeça.

Sílvia Câmara

terça-feira, fevereiro 10, 2009

Os anjos continuam...e tudo o que é belo também...


Em homenagem aos 100 anos de D.Hélder Câmara, cidadão mais pernambucano do que cearense. (1909 Fortaleza/ - 1999 Recife)


foto Silvia Câmara - MG 2009



O Juízo


Quando no dia da ira

os anjos reunirem os artistas

- tão fascinados de orgulho

pela participação direta no poder Criador –

vai ser difícil ao Filho

austeridade de juiz

tão nítida é

- sobretudo nos poetas -

a sombra do Pai.


Dom Hélder Câmara


( O deserto é fértil, 1981)



“Tem pena, Senhor

tem carinho especial

com as pessoas muito lógicas,

muito práticas, muito realistas,

que se irritam com quem crê

no cavalinho azul.”


Dom Hélder Câmara

quarta-feira, fevereiro 04, 2009

Sobre anjos e maratonas

foto Sílvia Câmara

Quando houve necessidade
Um silfo veio ter comigo
E eu andava pelos campos afora
Quando vi aquela luz violácea,
Arrebanhando as nuvens.
Percebi o sopro benfazejo:
Caminhando nas asas do vento
Inspiração e força.
!Adelante!
!Ultreya!
Prosseguimos! Obrigada, meu Anjo.


Sílvia Câmara (após a Ultramarathon BR 135 - mais de 217Km em 59:43h - 23 a 25/01/09 - Parabéns Cas - my little brother-, Barb, Carla and César - Suseya!)